Documentário sobre o cantor e compositor Raul Seixas (1945-1989), ícone do rock brasileiro, que influenciou gerações de músicos e conquistou legião de fãs pelo mundo todo.
Por Felipe Brida
“Faze o que tu queres, há de ser tudo da lei”. Com essa famosa frase de liberdade e independência, Raul Seixas idealizou o polêmico movimento da Sociedade Alternativa em plena época de Ditadura no Brasil. Baiano de nascença, levantou a bandeira da Contracultura e do amor livre, cutucou o sistema, deu tapas na cara dos militares, foi “convidado” a sair do país nos anos 70 (junto com o parceiro de canções e de drogas Paulo Coelho), entregou-se à boemia, virou ícone popular respeitado, usou entorpecentes dos mais impossíveis e inimagináveis, e, como toda figura da grande mídia marcada pelos excessos, morreu cedo.
Toda a incrível jornada de Raul Seixas está nesse importante documentário brasileiro dirigido por Walter Carvalho, que conseguiu registrar com exatidão um retrato sem meio termo do artista que inovou o cenário musical do nosso país com canções provocativas, muitas delas ainda na ponta da língua de muitos.
A contracapa do DVD e do Blu-Ray, em breves palavras, contextualiza o trabalho de Raul e seu significado para a música: “Enquanto o mundo fervilhava nas trepidações das motos de Easy Rider, no ritmo frenético de Elvis Presley, nos poetas Beatniks, na explosão da contracultura, um menino da Bahia deu a luz ao Rock no Brasil. Um disco voador desgovernado que abduziu o coração e a mente de milhares de fãs. Raul Seixas, um homem que virou mito”.
Do som para as telas, um artista multifacetado: o Raul pai, as inspirações, as amizades, o satanismo de Toninho Buda, as mulheres e as amantes, a cocaína, o álcool, as letras que emocionaram pela dor de ser gente e outras que fizeram rir das nossas próprias tragédias. Por isso Walter Carvalho, com a tradicional verve jornalística enraizada na alma, captou tão bem a vida e a obra de Raul, cumprindo com o papel investigativo, o de mostrar os dois lados da moeda, ou melhor, do compositor. As entrevistas propiciam a visão imparcial de quem foi Raul – concedidas por amigos, colegas compositores, escritores, familiares, ex-mulheres. E muitas imagens raras de arquivo dimensionam sua assombrosa personalidade.
Há momentos controversos, como os depoimentos dos antigos companheiros de uma seita satânica (acompanhados de vídeos antigos deles fazendo rituais e sacrifício de animais), e de Paulo Coelho, que abre o jogo revelando que levou as drogas a Raul – e uma sequência cômica, também protagonizada por Coelho, envolvendo uma mosca real durante a gravação.
Um trabalho obrigatório aos fãs. Eu, como um deles, tive meus momentos de emoção, confesso, e fiquei deslumbrado com o resultado.
O paraibano Walter Carvalho, famoso pela direção de fotografia de obras premiadas (“Central do Brasil”, “Lavoura arcaica” etc), realiza o segundo perfil sobre um cantor brasileiro – o outro, no formato ficção e não documentário, foi “Cazuza – O tempo não para” (2004), também uma obra altamente recomendada.
“Raul: O início, o meio e o fim” sai no Brasil em DVD simples e em Blu-Ray, esta numa riquíssima edição de colecionar, que contém o documentário, extras, a trilha sonora (dois CDs), com músicas de Raul, um livreto especial sobre a carreira de Seixas e uma cópia da letra de Gita escrita à mão por ele. Imperdível.